terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Rio

Todos os dias eu sentia o ar trivial das manhãs. Aquela luz forte rompendo meus olhos passava com a simetria ideal sobre as frestas das janelas, era o verão que matava-me com um veneno doce do amanhecer.  Nessa época, sempre, acordava com a sensação do acordar sem dormir."Quando essa cidade ficou assim tão quente"?

domingo, 13 de maio de 2012

Conto - Sussurros molhados com creme de leite

   As ruas eram escuras, tão escuras quanto o fundo do mar mais fundo, e na verdade existiam postes que piscavam com lâmpadas trêmulas e seus restos de luzes, exatamente como se vê quando a luz penetra a água. Eu encontrava-me ali, quase que perdido, se não fosse da minha vontade estar exatamente naquele lugar. Na verdade não sabia onde estava, minto, sabia, mas não sabia propriamente. Conhecia-o apenas de ouvir falar: “Sobre os paralelepípedos descambados do inferno”. 

    As mulheres estavam vestidas de vitrine e não sabia se eu devia experimentar meus olhos com aquelas mulheres, pelo menos não naquele momento. Sentei-me na mesa de um bar qualquer, situado entre o Café Boulevard e o Hotel Paris, que não era propriamente um hotel. Tomei apressadamente algumas doses de conhaque, dei algumas tragadas fortes no meu cigarro e criei coragem de entrar no Hotel Paris. No hotel pude claramente ouvir, antes mesmo de entrar que rolava um jazz, uma banda improvisava arranjos com um sonoro solo de saxofone. Dentro, do hotel, os músicos estavam quase que totalmente embriagados - contudo o som que faziam era da grandiosidade de Miles Davis, - as luzes eram turvas, quase apagadas e as mulheres estavam encostadas no balcão, quando não estavam sentadas sobre o pau de alguém, evidentemente tentando extorquir, com carinho devo frisar, o máximo possível de dinheiro de um bando de pobres coitados, assim como eu. 

    No balcão, pedi um uísque, e logo, surgiu uma mulher "oferecendo-me" que lhe pagasse uma bebida qualquer. Paguei-lhe um uísque, e alguma coisa que quisesse comer; ela parecia estar faminta, pois suas mãos tremiam e seus olhos estavam compenetrados como os de um cachorro. Percebi, claramente, que ela envergonhou-se da forma indelicada como agia e eu não fazia questão de formalidade, ainda mais com uma puta. Pedi-a que comesse com calma, não estava com pressa para fazer nada. Ela retribuiu-me apenas com um singelo sorriso e logo voltou a comer feito um bicho. Olhei para ela, reparei nos detalhes que meus olhos não evidenciaram num primeiro instante. Sua blusa estava bem puída, e não sei como aquele trapo suportava o tamanho e o peso daqueles peitos. Com isso dei um breve sorriso. Ela notou no meu gesto e me perguntou: - “Do que você está rindo”? Respondi-lhe que sorrio sozinho quando encontro coisas que não sei explicar ou quando isso me traz grandes dúvidas. Ela devolveu-me um sorriso meio frouxo certamente de quem não entendeu o que eu queria dizer, e sem dúvida, ela estava me achando um tanto excêntrico. 

    Ela parecia ter pressa de tudo, pressa de comer, beber, fumar e de me levar para o quarto no andar acima de nós. Talvez, digo talvez com quase certeza, ela queria despachar-me logo, contanto que lhe deixasse uma boa recompensa por seus serviços, o que era que lhe interessava realmente. Não estava com pressa, ainda mais porque havia acabado de chegar. Eu queria aproveitar o que aquele lugar místico tinha a oferecer aos meus olhos que estavam em sintonia com aquilo tudo, com aquelas putas com seios descobertos, com a suntuosidade de corpos simétricos e com a libido escorada nas paredes descascadas. Perguntei-lhe seu nome e ela respondeu-me em grande estilo: - “Isso importa realmente”? Eu gostei daquela arrogância, daquele jeito arredio com que se comportara. Respondi-lhe que realmente isso não importava e que era apenas perda de tempo. Ela beijou-me, de forma esplêndida, seus lábios eram macios e molhados, e sua língua atingia-me com golpes de esgrima: - “Meu nome é Cintia” – “me disse isso ao meio de sussurros molhados”.

    Ao mesmo tempo em que me deleitava diante dos seus abraços quentes e pela forma de seu corpo, que pude comprovar no ato de alisar suas suntuosas curvas, pensei no tanto que as coisas são mecânicas. Cintia sorria-me, uma mostra de dentes amarelos, e eu excitado, esfregava-lhe levemente meu pau, de baixo para cima, em seu útero vestido de seda; encontrava-me tão alugado quanto ela, mesmo sendo eu a parte que pagava. A necessidade levou-me para aquele lugar... Não necessariamente digo de algo carnal, pois viver em uma cidade grande como o Rio de Janeiro, não é nenhum pouco difícil encontrar uma boa foda. Existem mulheres sonhando por algo proibido, casadas, solteiras, elas procuram aquele sussurro de indecências bem pertinho do ouvido, procuram aquele homem que seja capaz de agarrar-lhe os seios em público, de trepar dentro do banheiro enquanto olhos curiosos espreitam. Bem, na verdade, todos gostam, todos gozam dessas insinuações de paixões instantâneas, mesmo que existam pessoas que afirmam, de pés juntos, que isso não passa por suas cabeças ou sequer pelo lado de fora de suas vidas. 

    Eu a beijava e os nossos movimentos quase reprimidos iam ganhando vida; como num carro que parte depois que sua primeira marcha é engatada. Em certo momento pude sentir - Ou adiantar alguns minutos em minha mente - Comecei a sentir seu útero agasalhando-me, quente e acolhedor eram as suas bordas, como um casulo de borboletas. Pedi então para subirmos, o descontrole já havia me possuído e, só fodê-la poderia tirar o diabo de dentro da minha calça. O quarto em que ficamos era de pura miséria dava para notar que ali se tinha um grande movimento; os lençóis encontravam-se amarrotados e as paredes enegrecidas de fumo. E a única luz que penetrava dentro do quarto provinha da rua, de uma placa de publicidade que lançava luzes feitas de vaga-lumes. Eu não ouvia mais a banda de jazz a única coisa que ouvia eram as vozes das pessoas que conversavam, gritavam, bebiam, fumavam e se drogavam. – “E o cheiro de maconha que entrava em nosso quarto era algo tentador”. Fui à sacada do quarto, a fim de conferir toda a algazarra, toda a agitação que se passava lá em baixo. As mãos da minha puta abraçaram-me, ao mesmo tempo em que me apalpava abria mansamente a minha camisa. Suas mãos eram ásperas, mas sabiam tatear meu corpo como se conhecesse todas as minhas imperfeições, todos os meus relevos. Ela encontrava-se nua e seu corpo fedia a cansaço, nada que tirasse a minha concentração; pra falar a verdade aquele cheiro excitava-me, cheiro de suor, cheiro de corpo que não ostentava os refinos dos perfumes franceses. 

    A cama havia sido preparada e eu nem tinha reparado. Não propriamente poderia chamar aquilo de arrumação, mas foi à forma delicada que ela viu para me dar conforto. - Apenas escondeu o lençol e jogou sobre a cama uma toalha úmida. Penetrá-la foi bom, seu corpo movia-se, ora seguindo o meu balanço, ora parecia ter vida própria, seus movimentos descompassados eram ricos e diferenciados, e proporcionaram-me prazeres inolvidáveis. Ficamos por algum tempo deitados, olhando para o teto cheio de infiltrações, sem sequer dizer uma palavra um para o outro. Ela virou-se de lado, com suas costas voltadas para mim, e eu pude claramente reparar nos seus pulmões enchendo e esvaziando de forma ofegante, suas costelas sobressaiam estufando sua pele quando o ar a visitava. Abracei-a, generosamente, grudando seu corpo ao meu, dei-lhe um beijo singelo no pescoço e ela buscou meu braço, como se naquele ato quisesse me dizer algo, como se buscasse a proteção que nunca conhecera em toda a sua vida. Eu achei agradável aquela demonstração de carinho - Só não achei que encontraria isso com uma puta - e estava tão gostoso o momento que ela parecia há primeiro instante ter dormido. Eu consegui desfazer-me dos seus braços e vesti-me rapidamente. Enquanto calçava meus sapatos, sentado à beira da cama, pensei, juro que pensei se a pagava ou não. Confesso, hesitei por um instante, acendi um cigarro como se quisesse nesse ato encontrar o meu caráter. Olhei para ela nua atirada sobre a cama, certamente vencida pelo cansaço, em seu corpo pequeno e frágil e notei a covardia que seria se não a pagasse. Retirei uma nota de cinqüenta reais do bolso da minha calça, muito mais do dobro do preço que me cobrara, e o deixei sobre o criado-mudo ao lado da cama, e sai em silêncio, sem sequer olhar para trás. Na rua, em meio a algumas pessoas bêbadas, olhei para cima buscando, despedindo-me, e surpreendi-me ao vê-la enrolada em um lençol fitando-me, retirei o chapéu como forma de comprimento e, ela sorriu como se quisesse me ver novamente.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Crônica - Nem...

Ontem, enquanto trabalhava, vi um Helicóptero pousando no Tribunal de Justiça, ali na Av. Presidente Antônio Carlos. Nunca tinha visto um Helicóptero, assim, tão de perto, o único que tinha visto era o do Papai Noel chegando no campo do Portela, doando suas bolas de futebol que não duravam mais de meio dia. E eu na idade da puerícia ficava imensamente feliz: - Caraca, Papai Noel existe. Porém algumas perguntas rondavam a minha cabeça: - Papai Noel, cadê seus tricolores? Quer dizer seus viadinhos? Quer dizer suas Renas? Acreditava piamente que Papai Noel era uma figura boa, e por isso, como exemplo, nos mostrava com seu gesto tecnológico, que maltratar animais devia ser algo absolutamente deixado para trás, para nossos grosseiros antepassados. 

 Vendo aquele Helicoptero pousando no TJ pensei: - A pessoa que está chegando nesse helicóptero deve se importante. Esse Helicóptero era grandão, bonitão, que sem dúvida colocaria o papai Noel Portelense, no minimo, enciumado. Mermão - pensei - deve ser uma entidade religiosa daquelas. 

Depois descobri que quem havia chegado era o tal de Nem, não queridas Renas, não era o Wellington Nem. Simplesmente era aquele Nem - traficante, assassino entre tantas outras coisas. Cara, fiquei indignado: - Como assim é o Nem? Sabe quando eu vou entrar num Helicóptero? Nunca! O Papai Noel Portelense, esse que doava suas bolas dentes de leite, torrava todo o seu 13° salário pra alugar um pequeno e modesto Helicóptero. 

 Aí me perguntei novamente: - Quem é que paga a conta desse Helicóptero do Nem? Coloca esse maluco pra andar de charrete, ele não veio trazer presente pra gente!

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Conjecturas


À noite sento, olho ao redor, no meu eixo de quimeras e enganos ao vento, ao frio, ao relento. Não sou bem vindo, apenas observado com olhos e veias tão esticadas. O que faz de mim ruim e pecaminoso? Sim, posso imaginar... Minhas verdades tão subliminares, sem importância a olhos tão certos de si. Mentiras então, por que não? Seja como for, eu me desarmei há muito tempo. Se lhes disser a verdade serei vilão, se lhes disser mentiras serei expulso do meu próprio eixo, e se fizer o certo serei o herói mais triste do mundo. Tristeza não me parece o mais correto, o mais lúdico dos afazeres. Pois bem, matem-me da maneira mais cruel, talvez mereça mesmo ser cortado, fatiado; porém jamais me engula, porque vão ter uma azia insuportável. Sei, e muito bem por sinal, que não sou o mais simples dos seres humanos e nem o mais fácil de lidar sobre qualquer coisa. Infelizmente, tenho a resposta de tudo, mesmo que soe como uma grande idiotice. Como me diz o Leandro pro Sérgio: Você quer porfiar com uma faca, logo, com um samurai. Dessa forma nada posso ser se não isso, um cancro no coração de quem me ama!

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Conto - O morto

Um homem morreu nesta manhã e ouvem-se daqui de casa e de todo o prédio os gritos melancólicos da família do apartamento ao lado. Todos, inclusive eu, querem saber o que está acontecendo, todos  sentem-se de certa forma atingidos e abalados pelos espasmos da morte. O pensamento está vivo e a morte, como dizia minha falecida avó, que Deus a tenha, mora ao nosso lado. Os pêlos do corpo arrepiam-se, certo amargo apodera-se da nossa boca quando sabemos que alguém partiu dessa pra melhor e tudo o que nos resta, acredito que como consolo, é alisar com a ponta dos dedos o velho crucifixo de prata e rezar, rezar bastante, para que Santa Rita de Cássia nos livre desse mal. Amém.

Tudo pareceu parar naquele instante de gritos e súplicas matinais. O trânsito pareceu menos trânsito, o mar pareceu mais brando e o vento parou de socar as janelas de vidro. O mundo finalmente havia respirado, puxou do fundo sua essência para se revelar vivo. Seria Deus agindo? Aquilo parecia comum, não seria a primeira pessoa a morrer, porém aquilo era diferente, era triste demais, pois todos rezavam e agradeciam pelo acontecido ocorrer do canto de lá da parede.

Eu me senti mais solitário do que de costume, tudo se torna tão instintivo quando esse perfume de rosas mortas passa beirando pela medula. Arrepiam-se os pelos, a alma se agita, fica mexida de liquidificador, são neblinas, silêncio e só. A gente passa entender um pouco de tudo ou um pouco de nada ou tanto faz. O que precisamos saber mesmo é que somos a poeira esquecida debaixo do tapete, pode demorar, mas um dia alguém nos acha e deixa o chão limpo. É assim o princípio da vida. A eternidade que dura o tempo de um abraço, um encontro.

Eu sentia pena em saber que alguém partiu assim tão de repente, mas o que eu podia fazer? Nada. Dizem os sábios que existe um principio básico pra tudo e o básico de cada um é ter que sobreviver e foi o que eu fiz. Quando a morte veio até mim e me perguntou se eu gostaria de morrer, respondi-lhe: “Eu não, mas posso te indicar alguém”.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Conto - Dançando valsa nos salões do céu

Os santos jazem com seus braços erguidos na incumbência da prece, as janelas continuam abertas, as plantas continuam mortas no canto abandonado. A televisão ligada foca sua imagem enquanto assimilo o seu ruído de interferência. E eu venho andando, andando... Saindo pela porta a luz se torna negra, funda, e o que me sobra é uma turbidez enquanto desço degrau a degrau a escada. A bicicleta da rua passa, os pássaros tentam cantar, os carros caminham seguindo a turbulência das suas cores que correm apressadas como um tiro: - “Balas de revólver deviam ser coloridas”. O céu grita que vem chuva e a paisagem com nuvens pretas assustam as poeiras. E eu venho andando, andando... Uma voz não me chama a atenção, duas vozes conversam, porém nem a curiosidade é capaz de me fazer parar. O trajeto é o mesmo do atropelado da semana passada, trilhas e trilhas de sangue levam ao final, ao início. As fumaças são gloriosas e eu as respiro, as devoro, puxando pelas minhas guelras abaixo uma característica da natureza que me faz querer ser esse complemento dançando no ar. Na praça, o gramado é verde e as flores amarelas são as mais bonitas pra se compartilhar num sonho. O mar está a minha frente e na areia branca escrevo meu nome: “Nunca tinha feito isso”. Tiro a roupa, fico nu, e contemplo a água gelada tatear meu corpo enquanto o sal penetra minha pele. É pouco tempo, e quero nadar, nadar... Meus amigos estão no bar tomando cerveja e a afeição de felicidade também não se completa. Queria pedir-lhes perdão pelo abandono, por não saber usar o telefone de vez em quando. Tenho tão pouco tempo... Não quero ir embora daqui. Onde estive esse tempo todo que não reparei...

domingo, 22 de janeiro de 2012

Ogiva

Às vezes, a gente se sente diferente, um merda por assim dizer, acorda com um emaranhado de sentimentos e nunca sabemos qual o lado dentro da gente que está mais fedendo. Sabe aquelas sensações de quando o nosso coração parece uma pequena ogiva nuclear? Então, sinto-me assim, um pouco Angra dos Reis. Pareço que estou sempre correndo um grande perigo de ser varrido do mapa.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

De nada

Às vezes, quando fechamos os olhos, no fundo a sua música preferida, descobrimos coisas importantes. Não digo de paz interior, de encontro com você mesmo, isso é tudo balela pra bêbado de rua. O mundo precisa de blues, de garotas semi-nuas e de sentimentos que sejam verdadeiramente conivente com o seu pensamento. Nós somos o que pensamos, e qual o erro no pensar? No pesar? Eu não sei porque cismamos em nos esconder, em medir as palavras para nos enganar. A ideia principal que se deve ter é que esse plano é uma lixeira, e ela só é assim porque nós vivemos nela. A gente vive se enganando, pois muitos dos nossos amigos são sanguessugas que se deleitam com nosso sangue e ponto. E a felicidade, puts... Essa não existe, é figurada, transfigurada. Nós corremos atrás dos momentos, que sim, podem ser felizes, porém esses serão momentos raros e calmos. Talvez o nosso comportamento fosse um pouco diferente se lixássemos um pouco nossos miolos com bombril, se tirássemos um pouco desse lodo que nos faz esquecer que existe uma vida, um detalhe tão simples e revigorante que se chama amor. Não falo de paixões meladas de sofrimento e despedida, mas em amar-se com seriedade primeiro para que assim possamos dar uma lição de nada para ninguém.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

15 segundos antes de um colapso

Com meus passos falsos, caminhando sobre seu teto de vidro
Com o martelar das minhas profundas pegadas ...
Provocando rachaduras e dores em sua cabeça
Sua tristeza é a minha deixa,
Querendo se aproximar sem saber como!?
A fé que ele mantém em você é a mesma que eu tenho...
Meus cigarros estão aqui cantando seu nome
Venha buscá-los
Não ache que sua diferença é única
Voe por cima das divergências
Não se culpe, não ache que a razão é exclusividade sua
Não deixe que cuspam em você
Levante a cabeça, seja uma rainha ...
Controle com sua força, destrua os dragões
O que você diz ser amargura,
eu digo ser ... Caramelos ... pirotécnicos
Guarde sua fé para algo melhor
Não dê vazão o que ele diz
Seja dura como uma parede de concreto
Não pertença nem ao lado A e nem ao B
Fique comigo no mundo paralelo...
Invente, reinvente, faça o que quiser
Guarde seu coração sangrando
Em um pote de vidro
Se não sente vergonha mostre-o,
Para a peripécias da vida
Mas não se jogue, não se atire
Mostre-me ser o que eu sei que você é...
Mas sempre me surpreenda
Essa é a graça!

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O eterno retorno

Esse final de semana, será o final, será meu grande retorno as minhas origens. Quando penso em rotornar, penso muito na minha terra, nos meus amigos e no desejo incontrolável de ir ao lago, abrir uma garrafa de brahma bem gelada, sentir a brisa, tocar um violão e trocar aqueles papos agradáveis como sempre fiz. Neste final de semana irei com certeza ao Lago de Javary, sentar, olhar as águas esverdeadas e pensar no quão feliz eu sou por poder estar onde quero!

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Seu cheiro

Fiquei pensando, gélido, como uma estátua de São Petersburgo, parecia que meu sangue havia engrossado, e todo movimento que exercia tinha suas conseqüências, dores abdominais rondavam-me, uma tromba d’água parecia mergulha-me num subterfúgio, eu estava me sentindo mais inútil que um Sudro. Estava irrequieto, a madrugada passava lenta, tão lenta como o veneno mais cruel e aparentemente tudo isso iria circular por horas intermináveis. Abri uma garrafa de uísque e fiquei embriagando-me, era o único ato que parecia ser coerente com o que eu estava pressentindo, eu tomava longas doses, enchia minha boca toda, sentia o álcool corroer o céu de dentes e engolia, literalmente, tudo de uma única vez. Era a única coisa que me fazia sentir mais quente. Era o cobertor mais quente que eu poderia conseguir. Rapidamente a garrafa ia se esgotando, eu parecia um ralo sem rolha, tudo o que caía sobre mim ia descendo por completo. O cinzeiro rapidamente se encheu de cigarro, eu estava desesperado, estava com medo de perdê-la, e toda vez que me lembrava da sua imagem era um novo choro. Eu parecia uma criança, estava mais bêbado do que uma porca, e isso fez reduzir a quantidade dos meus neurônios para o nível mínimo. Fui até a minha pequena biblioteca e peguei o livro “Cem anos de Solidão” do Gabriel Garcia Marquez e o abri, era ali que escondia meu pó, cheirei todo aquele saquinho com apenas uma puxada e me senti um monstro, parado em frente ao espelho, não conseguia me reconhecer, meu rosto havia se tornado um grande borrão, o que acabou me deixando desesperado. Essas horas foram de pavor, de pânico, andava todo o apartamento compulsivamente, tentando devorar minhas idéias, tentando me esconder do medo, dos demônios que cresciam dentro de mim. Entrei no banheiro, tirei a minha roupa e me joguei debaixo do chuveiro, a água percorria a silhueta do meu corpo, e me meu coração batia tão forte como os tambores da guerra, eu estava submerso na idéia fixa de não ter mais Alice, dela pertencer a outros braços, um novo suor, que enriquecesse ainda mais a sua pele de sal. Sai do chuveiro, deitei na minha cama, ainda molhado, e tentei por horas dormir, sem sucesso, eu estava perturbado, havia um pensamento abrasivo na minha mente, estava precisando muito da presença de Alice, precisava sentir seu cheiro e foi o que fiz, abri o seu armário, abri uma mala de viagem dela e senti o perfume das suas roupas, uma por uma, e acabei ficando dentro da mala, misturado as suas peças de roupa, encolhido, até adormecer.

domingo, 23 de outubro de 2011

A noite nunca tem fim

      Aos meus amigos

 Liguei para o Gabriel e pro Francisco para marcar da gente tomar umas cervejas, estava tão feliz que tudo o que eu desejava era compartilhar minha felicidade com meus melhores amigos. Queria apresentá-los a Alice e perguntar o que eles achavam dela. Tinha quase certeza que iriam gostar, mas é sempre bom sentir o que os outros têm a dizer pra se ter certeza quando algo é verdadeiramente importante. Homem quando nasceu pra ser otário, é otário a vida toda e eu não queria ser um daqueles homens que não vê e não ouve nada por causa de mulher. Gabriel disse que iria ao encontro, mas acabou não indo, Emilie, a francesinha dele, havia voltado para França e ele me disse no dia seguinte ao nosso encontro que não estava se sentindo muito bem, algo completamente compreensível, quando algo importante se torna distante. Gabriel me explicou que ela precisava fazer uns exames médicos lá na França e que precisava ganhar uns “Euros” para quando voltar ao Brasil, voltar definitivamente, coisa que não demoraria muito a acontecer, pois em março estaria de volta pra ele. Francisco, sim, iria ao encontro, estava curiosíssimo para conhecer a mulher que tanto me ouviu falar. Encontramo-nos na Rua Dom Hélder Câmara, na altura do Shopping Nova América, para irmos juntos ao “Escritório”- Bar da Tijuca que marquei de me encontrar com Alice. Pegamos o metrô e não mais que meia-hora estávamos no local combinado. Alice me disse que levaria uma amiga pro Francisco que já, antes mesmo de conhecê-la, tinha motivos suficientes pra gostar dela. Gostou ainda mais da Alice quando viu a Raquel, sua amiga, que era tão pequenina quanto ele, porém, apesar da estatura, tinha uma beleza que quimicamente era compatível com a dele. A Raquel tinha um par de coxas grossas, sóbrias, que deixou meu amigo titubeando, ou melhor, babando, apenas no ato de comê-la com os olhos. Entre algumas conversas mescladas entre nós, num curtíssimo espaço de tempo, eles dois já estavam se beijando e beijavam de uma forma que parecia que aquela cena na minha frente nunca iria ter fim. Estávamos mais misturados na nossa amizade do que a fumaça do cigarro que tragávamos, era como se o limite estivesse fugindo da nossa frente e estávamos tão dispostos a ultrapassar o velocímetro desse carro, que duas caixas de cerveja desceram facilmente por nossas guelras. Fomos praticamente expulsos do Escritório, já deveriam ser umas quatro horas da manhã de uma segunda-feira, pagamos a conta e partimos à procura de outro bar que estivesse aberto até àquela hora, coisa que não conseguimos achar. Decidimos ir para outro lugar, iríamos nós quatro no local mais improvável possível. Pegamos um ônibus, e fomos fazendo arruaça, o motorista do ônibus nos encarava com um olhar desafiador, como se pudesse a qualquer momento puxar um revólver e atirar na gente. Descemos na Praça da Bandeira, atravessamos a passarela, e entramos num local escuro, muito escuro mesmo, estávamos na Vila Mimosa. Todas as pessoas que vimos estavam completamente drogadas, aquele local emitia medo, parecia que a qualquer momento poderíamos ser abordados, ser assaltados, porém, nem o risco de perder a vida parecia um motivo grande o bastante para impedir que bebêssemos. Uma chuva fina de repente começou a cair e meus pés encharcaram-se pela água da chuva e por uma água negra, provavelmente de um esgoto a céu aberto, e isso era repugnante, era nojento, pois essa água estava parada dentro do meu sapato e eu a imaginava penetrando dentro da minha pele embriagando minhas células sadias. Vimos um bar ao longe, e ele parecia interessante ou ao menos sossegado; do lado de fora vimos que suas luzes azuladas não aparentavam discrição o que acabou guiando ainda mais os nossos olhos. Entramos e Alice logo foi pedindo uma cerveja, e antes mesmo do garçom encostar sua mão no freezer, Raquel perguntou a ele quanto custava e esse disse: - “Sete reais a garrafa”. Ficamos indignados. Mas não tanto quanto Alice, ela bateu a mão no balcão e disse apontando o dedo indicador na cara do garçom: - “Você é maluco por acaso”? – Francisco apenas colocou a mão no rosto e retrucou para irmos embora. Alice estava quase subindo em cima do balcão e se não a segurássemos teria batido nele devido à fúria que se desprendia do seu lado mais sombrio. E Alice não parava e continuava seu xingamento: -“Seu merda, seu filho da puta, vai tomar no cu seu garçom de merda”. Francisco enlouqueceu, estava morrendo de medo de sermos linchados por todos aqueles “cracudos” que estavam a nossa volta, realmente todos estavam nos olhando e parecia que a qualquer momento iriam vir calar as nossas bocas. Peguei Alice pelo braço e saímos todos nós correndo, vimos o primeiro táxi que surgiu e praticamente nos jogamos em cima dele, e como eu ria daquilo tudo, Alice e Raquel também se deliciavam com o que acabamos de viver, Francisco estava apavorado e só reclamava: - “Essa sua namorada é maluca, é maluca!” – E eu completei a sua afirmação respondendo – “Por isso que eu a amo, meu amigo, por isso que eu a amo”!

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Frestas e Arestas

Acordei como sempre às 7 horas, eu arriscaria dormir uns quinze minutinhos além do que de costume, mas com aquele despertador dos infernos que não para nunca de martelar é impossível prever uma vitória. Sim, eu sou fraco e me rendo ao lado mais infeliz da invenção humana. Inclinei-me rapidamente numa certa angulação, que como um bom aluno de física que sou, diria que meu corpo alcançou cravados quarenta e cinco graus. Não há nada pior do que isso quando se está completamente de ressaca, a cabeça dói, os olhos lacrimejam e os ouvidos parecem entupidos, sendo tudo o que você consegue fazer é declinar, vagarosamente, ajustando na parte mais confortável do travesseiro a sua cabeça. Nesses momentos de negação tudo o que você pensa é: - Por que eu fui sair ontem? E não existe nada pior do que você ir contra a sua vontade, ou seja, eu não queria nenhum pouco sair, estava cansado, com sono e com uma determinação ansiosa de finalizar a minha tese sobre a teoria do caos. 

 O culpado disso foi o Francisco Casa Nova, meu amigão, que estuda história na mesma universidade que eu. Esses alunos de história só pensam e ejaculam provérbios, suas filosofias, e suas debandadas carregam o mundo todo com suas lábias frescas e convincentes. Eu disse que não queria, mas aquele jeito solto e encantador de me dizer que existem prazeres maiores do que os da física acabaram me levando a um pub. Realmente estava um pouco perturbado de sonhar com as equações trajando biquínis na praia de Copacabana.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Setembrino

Era setembro e o céu estava claro e azul. Eu novamente estava parado naquele trânsito infernal, preso dentro de um ônibus na Avenida Brasil. Todos os meus dias eram feitos de caos e desordem. Eu estava febril naquele dia, não estava me sentindo muito bem, queria dormir pro relógio passar mais rápido, porém nunca consegui fazer isso dentro do ônibus, eu invejava muito o garoto ao meu lado que chegava a babar de tamanho cansaço. Tudo o que me entretinha, naquele momento, era que devido ao forte sol saiam fumaças do asfalto, nunca tinha visto isso. Tempo assim, sempre me deixa um pouco doente; é uma reação que o meu corpo tem quando o frio esta chegando, me disse uma vez um médico. Logo comecei a espirrar. Desci na suburbana, passei na padaria do Seu Pedro, esse que já me deu um saco com exatamente quatro pães e fui andando pra casa, peguei um pedaço de pau, como todos os dias faço, pra tocar o cachorro do vizinho que sempre consegue morder as bainhas das minhas calças.

Eu estava morando há pouco tempo no Rio de Janeiro, eu me mudei pra tentar melhorar de vida, me dar uma oportunidade, só que descobri que quem nasce cuzão morrerá dessa forma. Eu morava menos de seis meses aqui e não tinha nenhum amigo, sequer tive tempo de ir conhecer o Cristo ou ir pra qualquer outro lugar... Eu nunca havia visto o mar. Eu sou do interior do estado e assim que cheguei consegui um emprego em telemarketing, não que eu chame isso de sorte, pois todos os dias eu tomo um esporro do supervisor, ninguém sabe meu nome ou se importa comigo. Não sei sobre as festas, não trai minha mulher, não tenho uma, a única coisa que sei é sobre o Flamengo, tenho o sonho de ir ao Maracanã, porém nunca tive coragem de me arriscar por aquelas bandas. Eu poderia facilmente puxar papos sobre isso lá no trabalho, porém não tive a sorte de encontrar um flamenguista que eu julgava ser legal.

Eu consegui com muita sorte alugar uma pequena casa numa vila, pago metade do meu salário nela, ainda não consegui comprar os móveis, só consegui comprar um colchão e um rádio de pilha e ter isso me deixava muito feliz, ter as minhas coisas, meus sonhos e meu espaço no mínimo é reconfortante. No Rio de Janeiro faz muito calor e é quase impossível dormir dessa maneira, minha próxima meta é um ventilador, por enquanto vou sofrendo, segurando as pontas das noites mal dormidas. Nessa vila existem muitas pessoas e é engraçado como as pessoas nessas cidades são diferentes, todos vivem na mesma vila e aparentemente umas tem mais dinheiro do que outras, uns ostentam um carro, enquanto, outras madrugam comigo nos pontos de ônibus. As pessoas aqui são esquisitas, pessoas de cidades grandes são entronas fofoqueiras e sempre muito mal-humoradas, não que no interior não tenha isso, só que agora estou vendo isso em escala industrial.

Na minha cidade, Miguel Pereira, as pessoas são mais solidárias do que as daqui, aqui tem muito descaso, muita sujeira e poluição. Eu ainda não consegui me acostumar com os mendigos, sempre que vejo fico de coração partido, uma vontade de fazer alguma coisa por todos eles, porém eu não tenho condições pra isso. Pra falar que não faço nada, ajudo um senhor dando o que comer, isso quando ele aparece, teve uma vez que ele sumiu por mais de três semanas. Eu não sei o seu nome, acho até que ele não fala, deve ser isso, ele deve ser mudo, nunca me respondeu.

Eu sempre janto numa pensão ao lado da vila, a comida lá é barata e gostosa, porém eu me cansei de ter que comer sempre a mesma coisa todos os dias, duas variações de prato, num período de seis meses é dose, mesmo assim, eu não pensava em mudar de lugar pra comer, eu gostava da Tia, ela foi a primeira pessoa que conversou comigo, parece ser a única um pouco interessada em saber como foi o meu dia, como estão às coisas no trabalho, e eu sempre minto, digo que estou gostando, que tenho vários amigos, talvez, eu não queira confessar pra ela que eu sou um fracasso. Ela sempre diz pra eu trazer meus amigos pra ela conhecer e eu digo que um dia trago. Seis meses. Ela me pergunta sobre isso todos os dias. Quando irá conhecê-los, acho que ela tem a leve sensação que eu não sou uma pessoas feliz. Depois de mentir descaradamente pra ela nesse período, ela me disse, hoje, que eu sou uma pessoa boa, uma pessoa especial, eu dei um sorriso meio sem graça, e fingi estar agradecido. Eu não era uma pessoa especial. Era um tolo.

domingo, 9 de outubro de 2011

Cantos de desassossego

Sentir-se livre, solto, eram uma das coisas que nunca entendi muito bem, o significado dessa merda toda, os porquês que tudo tendia a necessidade de ser assim. Sempre odiei essas porras de hippies, e continuo odiando essa necessidade de paz, de cor e de viadinhos saltitantes. Sempre fui focado demais nas coisas que me pareciam importante, sempre meu umbigo, o universo que me interessava. Meu umbigo de galáxias era perfeitinho demais pra pedir a necessidade da atenção de alguém. Isso não me tornava uma pessoa ruim, muito pelo contrário, as pessoas me achavam engraçado, às vezes chato, confesso; porém era um circuito de pessoas que eu liberava para freqüentar meus arredores.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Café com leite de rosas

Tudo começou com uma música e certamente terminará da mesma forma. Essa música representa a intensidade dessa história, desse amor ordinário e controverso. Eu me odiaria se a música fosse outra, odiaria amar outra pessoa, poderiam até trocar as vírgulas, os parágrafos, à intensidade, o calor, a chama ou qualquer outro desenrolar, isso eu guardo pra mim, me basta. Às vezes, estamos tão fundo dentro de nós mesmos que não enxergamos que a solução das mazelas é deixar-se a deriva, deixar que as pessoas entre e estourem a bexiga, explodam aquela consciência fugaz, e te libertem daquele precipitar de solidão. Depois de muito tempo me sentia vivo, vivo o bastante pra me tornar amigo do tempo, das horas... Eu estava pronto pra viver, pra me jogar abaixo desse abismo e voar sem rumo. É bom pensar que a vida é assim, um tiro num peito de um morto, uma constante busca pro nada, uma história que se compõe a partir de um empurrão nas suas costas.

A gente ainda não sabe como discernir o que é real ou o que não é: Sabe o que me perguntei um dia desses? Uma pergunta simples. - Por que não? As coisas chegam a um ponto que se você se entregar a dor de barriga, ela, certamente, irá te assombrar pra sempre, eu não queria isso, aceitar que as coisas têm que ser impostas. Sempre aceitei tudo, com os ouvidos de burro, e sempre me senti instintivamente amarrado dentro desses pensamentos inúteis, desses excrementos, desse exercício diário que a rotina propõe. De repente, eu comecei a pensar, pois tê-la fez com que eu enxergasse um pouco a luz que havia sido destinada pra mim. Estava participando do seu céu, caprichosamente, dormindo nas suas nuvens, e esse foi o estímulo bom o bastante para dar um basta na minha vida.

domingo, 18 de setembro de 2011

Conto - O segundo dia

Peguei a calça de moletom no chão, abri o armário, peguei um casaco de lã e constatei que hoje fazia bem mais frio do que ontem. Meus dentes se batiam de tamanho frio, há muito tempo eu não via um frio daqueles, fui abrir a janela do quarto para descobrir que não é pra abrir essa ou qualquer outra janela nunca mais. Peguei o cobertor, joguei-o sobre meus ombros e fui à cozinha preparar um saboroso café. O pão eu coloquei numa chapa para esquentar e sobre ele passei uma manteiga, essa, que derretia com tamanha perspicácia que não me contive em dar uma mordidela. Levei tudo para o quarto, voltei a me cobrir, liguei a televisão e me senti como um conde solitário. Tudo parecia controverso, nenhum pouco satisfatório, porém estava me sentindo disposto e com uma vontade de escrever algumas coisas... Peguei a máquina de escrever, colocando-a sobre o meu colo, e continuei dando valor as fumaças que me rondavam naquele momento. Escrevi umas cinco páginas que até as considerei boas, mas completamente monótonas, estava me sentindo tão confuso quanto Jean Genet no início de o Diário de um Ladrão. 

Consegui levantar da cama, de acordo com o relógio, umas duas e quinze da tarde. Tirei as remelas dos olhos, tirei uma meleca do nariz e cocei meu ouvido esquerdo com o mesmo dedo que fiz todo o resto. Por isso é bom estar sozinho numa casa, sei lá, você se sente mais homem nessas horas, se sente mais livre de alguns conceitos. Fui ao banheiro dei uma bela de uma cagada e li metade do jornal que trouxe da viagem de ontem. Lavei minhas mãos e fui diretamente à cozinha preparar uma macarronada sem molho. E como estava ruim aquilo, puta que pariu, eu não sei por que insisto em coisas que não tenho talento. Uma coisa que devo confessar agora, eu sou muito chato com a minha teimosia. 

Eu estava precisando muito de cigarros e de bebidas quentes. Arrumei-me rapidamente, procurei um casaco bem grosso, coloquei uma touca que tampasse bem os meus ouvidos e procurei um guarda-chuva que fosse grande o bastante pra tampar três de mim. Ontem, enquanto passava de ônibus, vi que havia um mercadinho que julgava não ser muito longe daqui. Errado. O mercadinho era uns vinte minutos afastados da casa de praia, falando assim, nem parece muito longe, mas porra, vinte minutos de baixo de chuva, com toda a água que caía, é se considerar um pouco anfíbio. Enfim, cheguei ao mercado, encharcado, e fui logo à cessão de bebidas. Fui pegando, vinhos, uísques conhaques e afins. Fui ao caixa e perguntei à única pessoa que trabalhava naquele estabelecimento: - “Onde encontro os cigarros”? Ela parecia um pouco entediada e me respondeu: - “Vire-se”. Eu me virei e havia um grande anúncio de cigarros. Peguei três maços de Marlboro Light e perguntei quanto sairia tudo o que havia comprado: - “Tudo sai por quarenta e sete reais” - me respondendo ela friamente. Dei o dinheiro e saí porta a fora. 

Chegando a casa fui logo tirando todas as roupas molhadas e me direcionei ao banheiro. Fiquei nu, abri o registro do banheiro, e esperei que a água esquentasse o suficiente para que o “box” se enchesse de um vapor fervente. Nessa espera acendi cigarros, um atrás do outro, e fiquei pensando em branco. Entrei em meio à cortina de fumaça e senti aquela água tateando meu corpo, ficando horas e horas me deliciando, perdendo ou ganhando tempo, tanto faz, só sei que aquilo era distante demais do que eu havia sido induzido a fazer. Tomei o banho mais longo da minha vida, apressei-me para colocar roupas secas e bem quentes e abri uma garrafa de vinho. Liguei a televisão e fiquei assistindo a novela das dezoito horas. Acabei, pelo marasmo, cochilando. Acordei passando um pouco mal, uma dor no estômago que me doía intermitentemente, era uma dor tão forte, tão contundente que pensei várias vezes em sair atrás de um posto de saúde. Porém, chovia muito e o frio, que nos atravessa a carne, era algo indescritível até para um europeu. Por maioria de votos decidi ficar sofrendo no meu silêncio. 

Passei horas e horas implorando que aquela maldita dor passasse... Eu já fui a centenas de médicos, fiz milhares de exames e ninguém nunca me disse o que realmente eu tinha e de onde surgia todo aquele berro. Confesso, eu até comecei um tratamento, certa vez, era uma tratamento homeopático, muito demorado; porém, sou muito impaciente com resultados prolongados e acabava que em vez de tomar um comprimido, eu engolia de três a quatro diariamente. Só existia um método que funcionava contra isso... E eu o fiz.

sábado, 10 de setembro de 2011

Conto - O primeiro dia

     Chovia bastante, o que estava sendo comum naquela semana, e da janela meu maior divertimento era olhar o percurso da água na calha do telhado da garagem. Normalmente, nessas horas de reflexão, eu acenderia um cigarro e me libertaria de alguns pensamentos contundentes, porém tinha tanta preguiça de molhar meus pés e sentir o frio daquele vento que decidi que pra mim o melhor mesmo era estar na nostalgia. Eu, facilmente, poderia estar vendo um bom filme ou lendo um bom livro, só que não há nada de bom pra se ver ou ler nessa casa de praia. Tudo sempre foi um engano. 

     Meu maior sonho era ser um escritor, só que eu sempre fui preguiçoso demais pra terminar qualquer coisa. Eu até tinha começado um livro, por um tempo aquilo me fazia perder horas, coisa que ocupava meu tempo e minha cabeça, mas depois tudo se tornou um grande martírio, uma verdadeira encheção de lingüiça. Alice disse que o livro estava ficando ótimo, só que eu não tinha certeza de quase nada na minha vida, tanto não tinha que nem sabia o que Alice era minha... 

     A chuva já não me entretinha mais. Decidi então, por muita vontade de fazer alguma coisa, que cortaria a barba. Fui ao banheiro, fiquei de frente ao espelho, dei uma bela visualizada no meu rosto e decidi que não... Não cortaria a barba. Ela estava do jeito que eu gosto e certamente Alice reprovaria meu ato. Sabe o que ela diria pra mim? - “Marcelo, desespero não combina nenhum pouco com você”. E não existe nada que eu odeie mais do que dar razão a ela. Chuva, chuva, chuva, chuva, chuva. Sozinho, sozinho, sozinho. No meu discurso profético do anoitecer, certamente, teria muito dessas duas palavras. Já está escurecendo e isso é sempre bom pra se sentir mais próximo do amanhã, pois à noite, eu consigo pensar um pouco melhor, pode parecer mentira, mas com o barulho da chuva e quando não se vê as estrelas no céu eu fico bastante inspirado a escrever. Diferente de alguns poetas eu não preciso da lua pra nada. 

     Mesmo inspirado, eu tinha preguiça, muita preguiça mesmo. Outra coisa que odeio, tirando dar razão para Alice, é ter sono quando estou com vontade de escrever. Cara, por que isso sempre acontece comigo? – “Não sei, não sei, mesmo”. No relógio da parede marcavam meia-noite e fiquei um pouco realizado em ter lutado contra toda a profundeza do que é a preguiça e o sono em mim. Fui ao banheiro, escovei meus dentes em cinco minutos cravados, como costumo sempre a fazer, levantei a tampa do vaso sanitário, me curvei e joguei um pouco a cabeça pra trás, dei um gemidinho básico, dei uma sacudidela no meu pau, limpei com papel higiênico o canto do vaso que tinha mijado, puxei a descarga, apaguei as luzes, acendi as luzes, pois havia me esquecido de lavar as mãos, sequei as mãos na toalha de rosto e fui tentar dormir. 

     Exatamente, caro leitor, eu fui tentar dormir. Ao mesmo tempo em que chuva e noite me inspiram elas me tiram o sono, porém lutei como um guerreiro. Meu primeiro ato foi ficar quieto, o segundo ato foi relaxar, o terceiro ato foi tampar meus ouvidos com o travesseiro, o quarto ato foi pedir a Deus pra me fazer dormir, o quinto ato foi mandar tudo se fuder, o quinto ato achei melhor nem escrever aqui. Fui à cozinha. Abri a geladeira e fiz um sanduíche de presunto e queijo, preparei um suquinho de laranja e me sentei à mesa, puto, muito puto mesmo, com essa situação de seu corpo implorar pra dormir e sua cabeça não parar de pensar um monte de sandices. Eu não gosto de criar estímulos para dormir, mas porra, eu já havia me realizado naquele dia e não havia mais nada pra fazer, já havia até começado a escrever alguma coisa. Decidi procurar e só depois de muito tempo que consegui achar o Rivotril. Tomei um comprimido daqueles e mergulhei num profundo e sonolento marasmo, vagarosamente fui me deitando, me cobrindo, me aconchegando, ralando a cama e finalmente apagando.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Café e Açúcar

Eu senti algo congelando dentro de mim, parecia que havia água fria passando pelas minhas veias, só de vê-la passando pela porta, indo embora, e nem se passaram três segundos para bater aquela saudade do seu cabelo crespo. Nunca me senti só e imprestável como ontem. Meus planos desmoronaram como castelos de açúcar e todas as chances que havia conquistado não passaram de um deletério. Eu não sei o que acontecia, como as coisas tomaram essa forma, só sei que em questão de segundos me senti pior do que um cão. Eu estava arruinado, assim, como meu amor...

domingo, 4 de setembro de 2011

Afogando-se em seu próprio mar de fel

A cama havia sido preparada e eu nem tinha reparado. Não propriamente poderia chamar aquilo de arrumação, mas foi à forma delicada que ela viu para me dar conforto. - Apenas escondeu o lençol e jogou sobre a cama uma toalha úmida. Penetrá-la foi bom, seu corpo movia-se, ora seguindo o meu balanço, ora parecia ter vida própria, seus movimentos descompassados eram ricos e diferenciados, e proporcionaram-me prazeres inolvidáveis. Ficamos por algum tempo deitados, olhando para o teto cheio de infiltrações, sem sequer dizer uma palavra um para o outro. Ela virou-se de lado, com suas costas voltadas para mim, e eu pude claramente reparar nos seus pulmões enchendo e esvaziando de forma ofegante, suas costelas sobressaiam estufando sua pele quando o ar a visitava. Abracei-a, generosamente, grudando seu corpo ao meu, dei-lhe um beijo singelo no pescoço, e ela buscou meu braço, como se naquele ato quisesse me dizer algo, como se buscasse a proteção que nunca conhecera em toda a sua vida. Eu achei agradável aquela demonstração de carinho: - “Só não achei que encontraria isso com uma puta” - e estava tão gostoso o momento que ela parecia há primeiro instante ter dormido. Eu consegui desfazer-me dos seus braços e vesti-me rapidamente. Enquanto calçava meus sapatos, sentado à beira da cama, pensei, juro que pensei se a pagava ou não. Confesso, hesitei por um instante, acendi um cigarro como se quisesse nesse ato encontrar o meu caráter. Olhei para ela nua atirada sobre a cama, certamente vencida pelo cansaço, em seu corpo pequeno e frágil e notei a covardia que seria se não a pagasse. Retirei uma nota de cinqüenta reais do bolso da minha calça, muito mais do dobro do preço que me cobrara, e o deixei sobre o criado-mudo ao lado da cama, e sai em silêncio, sem sequer olhar para trás. Na rua, em meio a algumas pessoas bêbadas, olhei para cima buscando, despedindo-me, e surpreendi-me ao vê-la enrolada em um lençol fitando-me, retirei o chapéu como forma de comprimento e, ela sorriu como se quisesse me ver novamente.