domingo, 13 de maio de 2012

Conto - Sussurros molhados com creme de leite

   As ruas eram escuras, tão escuras quanto o fundo do mar mais fundo, e na verdade existiam postes que piscavam com lâmpadas trêmulas e seus restos de luzes, exatamente como se vê quando a luz penetra a água. Eu encontrava-me ali, quase que perdido, se não fosse da minha vontade estar exatamente naquele lugar. Na verdade não sabia onde estava, minto, sabia, mas não sabia propriamente. Conhecia-o apenas de ouvir falar: “Sobre os paralelepípedos descambados do inferno”. 

    As mulheres estavam vestidas de vitrine e não sabia se eu devia experimentar meus olhos com aquelas mulheres, pelo menos não naquele momento. Sentei-me na mesa de um bar qualquer, situado entre o Café Boulevard e o Hotel Paris, que não era propriamente um hotel. Tomei apressadamente algumas doses de conhaque, dei algumas tragadas fortes no meu cigarro e criei coragem de entrar no Hotel Paris. No hotel pude claramente ouvir, antes mesmo de entrar que rolava um jazz, uma banda improvisava arranjos com um sonoro solo de saxofone. Dentro, do hotel, os músicos estavam quase que totalmente embriagados - contudo o som que faziam era da grandiosidade de Miles Davis, - as luzes eram turvas, quase apagadas e as mulheres estavam encostadas no balcão, quando não estavam sentadas sobre o pau de alguém, evidentemente tentando extorquir, com carinho devo frisar, o máximo possível de dinheiro de um bando de pobres coitados, assim como eu. 

    No balcão, pedi um uísque, e logo, surgiu uma mulher "oferecendo-me" que lhe pagasse uma bebida qualquer. Paguei-lhe um uísque, e alguma coisa que quisesse comer; ela parecia estar faminta, pois suas mãos tremiam e seus olhos estavam compenetrados como os de um cachorro. Percebi, claramente, que ela envergonhou-se da forma indelicada como agia e eu não fazia questão de formalidade, ainda mais com uma puta. Pedi-a que comesse com calma, não estava com pressa para fazer nada. Ela retribuiu-me apenas com um singelo sorriso e logo voltou a comer feito um bicho. Olhei para ela, reparei nos detalhes que meus olhos não evidenciaram num primeiro instante. Sua blusa estava bem puída, e não sei como aquele trapo suportava o tamanho e o peso daqueles peitos. Com isso dei um breve sorriso. Ela notou no meu gesto e me perguntou: - “Do que você está rindo”? Respondi-lhe que sorrio sozinho quando encontro coisas que não sei explicar ou quando isso me traz grandes dúvidas. Ela devolveu-me um sorriso meio frouxo certamente de quem não entendeu o que eu queria dizer, e sem dúvida, ela estava me achando um tanto excêntrico. 

    Ela parecia ter pressa de tudo, pressa de comer, beber, fumar e de me levar para o quarto no andar acima de nós. Talvez, digo talvez com quase certeza, ela queria despachar-me logo, contanto que lhe deixasse uma boa recompensa por seus serviços, o que era que lhe interessava realmente. Não estava com pressa, ainda mais porque havia acabado de chegar. Eu queria aproveitar o que aquele lugar místico tinha a oferecer aos meus olhos que estavam em sintonia com aquilo tudo, com aquelas putas com seios descobertos, com a suntuosidade de corpos simétricos e com a libido escorada nas paredes descascadas. Perguntei-lhe seu nome e ela respondeu-me em grande estilo: - “Isso importa realmente”? Eu gostei daquela arrogância, daquele jeito arredio com que se comportara. Respondi-lhe que realmente isso não importava e que era apenas perda de tempo. Ela beijou-me, de forma esplêndida, seus lábios eram macios e molhados, e sua língua atingia-me com golpes de esgrima: - “Meu nome é Cintia” – “me disse isso ao meio de sussurros molhados”.

    Ao mesmo tempo em que me deleitava diante dos seus abraços quentes e pela forma de seu corpo, que pude comprovar no ato de alisar suas suntuosas curvas, pensei no tanto que as coisas são mecânicas. Cintia sorria-me, uma mostra de dentes amarelos, e eu excitado, esfregava-lhe levemente meu pau, de baixo para cima, em seu útero vestido de seda; encontrava-me tão alugado quanto ela, mesmo sendo eu a parte que pagava. A necessidade levou-me para aquele lugar... Não necessariamente digo de algo carnal, pois viver em uma cidade grande como o Rio de Janeiro, não é nenhum pouco difícil encontrar uma boa foda. Existem mulheres sonhando por algo proibido, casadas, solteiras, elas procuram aquele sussurro de indecências bem pertinho do ouvido, procuram aquele homem que seja capaz de agarrar-lhe os seios em público, de trepar dentro do banheiro enquanto olhos curiosos espreitam. Bem, na verdade, todos gostam, todos gozam dessas insinuações de paixões instantâneas, mesmo que existam pessoas que afirmam, de pés juntos, que isso não passa por suas cabeças ou sequer pelo lado de fora de suas vidas. 

    Eu a beijava e os nossos movimentos quase reprimidos iam ganhando vida; como num carro que parte depois que sua primeira marcha é engatada. Em certo momento pude sentir - Ou adiantar alguns minutos em minha mente - Comecei a sentir seu útero agasalhando-me, quente e acolhedor eram as suas bordas, como um casulo de borboletas. Pedi então para subirmos, o descontrole já havia me possuído e, só fodê-la poderia tirar o diabo de dentro da minha calça. O quarto em que ficamos era de pura miséria dava para notar que ali se tinha um grande movimento; os lençóis encontravam-se amarrotados e as paredes enegrecidas de fumo. E a única luz que penetrava dentro do quarto provinha da rua, de uma placa de publicidade que lançava luzes feitas de vaga-lumes. Eu não ouvia mais a banda de jazz a única coisa que ouvia eram as vozes das pessoas que conversavam, gritavam, bebiam, fumavam e se drogavam. – “E o cheiro de maconha que entrava em nosso quarto era algo tentador”. Fui à sacada do quarto, a fim de conferir toda a algazarra, toda a agitação que se passava lá em baixo. As mãos da minha puta abraçaram-me, ao mesmo tempo em que me apalpava abria mansamente a minha camisa. Suas mãos eram ásperas, mas sabiam tatear meu corpo como se conhecesse todas as minhas imperfeições, todos os meus relevos. Ela encontrava-se nua e seu corpo fedia a cansaço, nada que tirasse a minha concentração; pra falar a verdade aquele cheiro excitava-me, cheiro de suor, cheiro de corpo que não ostentava os refinos dos perfumes franceses. 

    A cama havia sido preparada e eu nem tinha reparado. Não propriamente poderia chamar aquilo de arrumação, mas foi à forma delicada que ela viu para me dar conforto. - Apenas escondeu o lençol e jogou sobre a cama uma toalha úmida. Penetrá-la foi bom, seu corpo movia-se, ora seguindo o meu balanço, ora parecia ter vida própria, seus movimentos descompassados eram ricos e diferenciados, e proporcionaram-me prazeres inolvidáveis. Ficamos por algum tempo deitados, olhando para o teto cheio de infiltrações, sem sequer dizer uma palavra um para o outro. Ela virou-se de lado, com suas costas voltadas para mim, e eu pude claramente reparar nos seus pulmões enchendo e esvaziando de forma ofegante, suas costelas sobressaiam estufando sua pele quando o ar a visitava. Abracei-a, generosamente, grudando seu corpo ao meu, dei-lhe um beijo singelo no pescoço e ela buscou meu braço, como se naquele ato quisesse me dizer algo, como se buscasse a proteção que nunca conhecera em toda a sua vida. Eu achei agradável aquela demonstração de carinho - Só não achei que encontraria isso com uma puta - e estava tão gostoso o momento que ela parecia há primeiro instante ter dormido. Eu consegui desfazer-me dos seus braços e vesti-me rapidamente. Enquanto calçava meus sapatos, sentado à beira da cama, pensei, juro que pensei se a pagava ou não. Confesso, hesitei por um instante, acendi um cigarro como se quisesse nesse ato encontrar o meu caráter. Olhei para ela nua atirada sobre a cama, certamente vencida pelo cansaço, em seu corpo pequeno e frágil e notei a covardia que seria se não a pagasse. Retirei uma nota de cinqüenta reais do bolso da minha calça, muito mais do dobro do preço que me cobrara, e o deixei sobre o criado-mudo ao lado da cama, e sai em silêncio, sem sequer olhar para trás. Na rua, em meio a algumas pessoas bêbadas, olhei para cima buscando, despedindo-me, e surpreendi-me ao vê-la enrolada em um lençol fitando-me, retirei o chapéu como forma de comprimento e, ela sorriu como se quisesse me ver novamente.

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