Era um sábado, tão monótono como qualquer outro em minha vida, acordei descabelado, bêbado e com uma ressaca que explodia as têmporas das minhas cabeças. O banheiro como sempre se encontrava imundo, papéis encharcados de merda transbordavam as cestas, os espelhos escorriam o flúor das pastas de dentes e dos sabonetes nasciam raízes de cabelos. Do jeito que me encontrava, encharcado pelo mormaço das noites, não podia dar o valor de recusar um bom banho. Sequei-me com uma toalha úmida que de branco passou à marrom, escovei meus dentes com pressa, e como não poderia ser diferente dei uma bola para suportar o resto do dia com um sorriso chinfrim na cara.
Na geladeira a única coisa tragável era a sobra de um mamão com mel de ontem. Limpei a mesa com apenas um ato e um braço, acendi um cigarro e me senti num mar de veneno, nessa lama inventada, nesse sangue das taças, nessa vida de margens. Entre todos os males o que menos incomodava era a doçura do mel... Eu sabia. Li no seu rosto o fogo, o gosto, o gozo e mesmo assim me virei de lado, ignorei seu sorriso, seu semblante apaixonado que me sussurrava carícias, afagos e gestos nobres no fundo do fim.
Meu pensamento estava nela, no telemarketing, no instigante sorriso que eu não podia sequer seqüenciar, mapear, decodificar. Eu estava tão morto quanto vivia, e dentro desse ato, dessa lama, desse comprado meio de vida, estava limpo e seco de saudade. Uma cigarra canta em meu peito, para assim, quem sabe, encontrar um delírio mais limpo para suportar a sua loucura, sua doçura e as estrelas da sua realidade.
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