terça-feira, 11 de outubro de 2011

Setembrino

Era setembro e o céu estava claro e azul. Eu novamente estava parado naquele trânsito infernal, preso dentro de um ônibus na Avenida Brasil. Todos os meus dias eram feitos de caos e desordem. Eu estava febril naquele dia, não estava me sentindo muito bem, queria dormir pro relógio passar mais rápido, porém nunca consegui fazer isso dentro do ônibus, eu invejava muito o garoto ao meu lado que chegava a babar de tamanho cansaço. Tudo o que me entretinha, naquele momento, era que devido ao forte sol saiam fumaças do asfalto, nunca tinha visto isso. Tempo assim, sempre me deixa um pouco doente; é uma reação que o meu corpo tem quando o frio esta chegando, me disse uma vez um médico. Logo comecei a espirrar. Desci na suburbana, passei na padaria do Seu Pedro, esse que já me deu um saco com exatamente quatro pães e fui andando pra casa, peguei um pedaço de pau, como todos os dias faço, pra tocar o cachorro do vizinho que sempre consegue morder as bainhas das minhas calças.

Eu estava morando há pouco tempo no Rio de Janeiro, eu me mudei pra tentar melhorar de vida, me dar uma oportunidade, só que descobri que quem nasce cuzão morrerá dessa forma. Eu morava menos de seis meses aqui e não tinha nenhum amigo, sequer tive tempo de ir conhecer o Cristo ou ir pra qualquer outro lugar... Eu nunca havia visto o mar. Eu sou do interior do estado e assim que cheguei consegui um emprego em telemarketing, não que eu chame isso de sorte, pois todos os dias eu tomo um esporro do supervisor, ninguém sabe meu nome ou se importa comigo. Não sei sobre as festas, não trai minha mulher, não tenho uma, a única coisa que sei é sobre o Flamengo, tenho o sonho de ir ao Maracanã, porém nunca tive coragem de me arriscar por aquelas bandas. Eu poderia facilmente puxar papos sobre isso lá no trabalho, porém não tive a sorte de encontrar um flamenguista que eu julgava ser legal.

Eu consegui com muita sorte alugar uma pequena casa numa vila, pago metade do meu salário nela, ainda não consegui comprar os móveis, só consegui comprar um colchão e um rádio de pilha e ter isso me deixava muito feliz, ter as minhas coisas, meus sonhos e meu espaço no mínimo é reconfortante. No Rio de Janeiro faz muito calor e é quase impossível dormir dessa maneira, minha próxima meta é um ventilador, por enquanto vou sofrendo, segurando as pontas das noites mal dormidas. Nessa vila existem muitas pessoas e é engraçado como as pessoas nessas cidades são diferentes, todos vivem na mesma vila e aparentemente umas tem mais dinheiro do que outras, uns ostentam um carro, enquanto, outras madrugam comigo nos pontos de ônibus. As pessoas aqui são esquisitas, pessoas de cidades grandes são entronas fofoqueiras e sempre muito mal-humoradas, não que no interior não tenha isso, só que agora estou vendo isso em escala industrial.

Na minha cidade, Miguel Pereira, as pessoas são mais solidárias do que as daqui, aqui tem muito descaso, muita sujeira e poluição. Eu ainda não consegui me acostumar com os mendigos, sempre que vejo fico de coração partido, uma vontade de fazer alguma coisa por todos eles, porém eu não tenho condições pra isso. Pra falar que não faço nada, ajudo um senhor dando o que comer, isso quando ele aparece, teve uma vez que ele sumiu por mais de três semanas. Eu não sei o seu nome, acho até que ele não fala, deve ser isso, ele deve ser mudo, nunca me respondeu.

Eu sempre janto numa pensão ao lado da vila, a comida lá é barata e gostosa, porém eu me cansei de ter que comer sempre a mesma coisa todos os dias, duas variações de prato, num período de seis meses é dose, mesmo assim, eu não pensava em mudar de lugar pra comer, eu gostava da Tia, ela foi a primeira pessoa que conversou comigo, parece ser a única um pouco interessada em saber como foi o meu dia, como estão às coisas no trabalho, e eu sempre minto, digo que estou gostando, que tenho vários amigos, talvez, eu não queira confessar pra ela que eu sou um fracasso. Ela sempre diz pra eu trazer meus amigos pra ela conhecer e eu digo que um dia trago. Seis meses. Ela me pergunta sobre isso todos os dias. Quando irá conhecê-los, acho que ela tem a leve sensação que eu não sou uma pessoas feliz. Depois de mentir descaradamente pra ela nesse período, ela me disse, hoje, que eu sou uma pessoa boa, uma pessoa especial, eu dei um sorriso meio sem graça, e fingi estar agradecido. Eu não era uma pessoa especial. Era um tolo.

Um comentário:

  1. E aí camarada!
    Parecem que nossos personagens andam sofrendo das mesmas penas. "Ilusões perdidas" do Balzac é um livro parece que escrito para nossa miserável pérola de ser artista.

    Abraço! Bom passar aqui!

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