sábado, 6 de novembro de 2010

Miles Davis' funeral

Quando se afoga qualquer sentido tudo o que vem a minha cabeça é: - “Como me livrar desse vácuo permanente”? Daquela vez, juro a vocês, eu quase morri afogado e seria capaz de repetir tudo novamente para ir atrás daquela sensação de anestesia na minha pele. Meus carbonos ferviam e minhas proteínas enovelavam-se, tudo parecia me consumir e mesmo sabendo que a morte me habitava e me punha dentro do seu cercado particular, o prazer e os significados da liberdade faziam um significado muito maior do que qualquer outra coisa pra mim. Ela era a melhor droga enquanto nos drogávamos juntos, era como se amá-la levasse os tons para cima e para baixo e toda a melodia tocasse ainda mais rápida. As horas de torpor queimavam conforme as fabulosas velas romanas, e era dessa forma que meu coração alcançava seu próprio término. A superfície que aproxima do fim me proporciona suas intenções e suas saudades; o contato mútuo, a faísca, a combustão e a fuligem... Tudo isso era fácil de encontrar e só podia ser encontrado naquelas horas especiais. Depois de erradicá-la das minhas frases, me senti como os sonetos mortos que leio todos os dias; porém, mesmo assim penso nela, exatamente, na sua última nota soprada nos meus ouvidos, como um saxofone, aquela nota doída que me disse para amá-la para sempre. Meus pulmões não agüentam tanta fumaça.

4 comentários:

  1. Kind of blue.Estou me sentindo Davis, Coltaine, vamos expelir nossas fumaças, folingens e desincantos. entrar em extase, torpor. Lembrar de nossas saudades, enquanto esquecemos nossos vazios. E viva as cervejas geladas! convite aceito.

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  2. Que belíssimo texto.
    A sutileza e a analogia amor/blues como duas drogas torna seu texto tão refinado, que a vontade de ler e reler é inevitável.

    Como sempre, seu talento com as palavras é inquestionável.

    é sempre um prazer ler e reler e reler e reler você.

    Grande beijo, Guilherme.

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  3. ah a fumaça!!!!
    este teu blog é formidável!
    é de muita qualidade o teu texto
    obrigada por teu talento!

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  4. "aquela nota doída que me disse para amá-la para sempre. Meus pulmões não agüentam tanta fumaça."

    Esse amor mais parece um câncer. Fumar demais dá nisso, essa fumaça...

    De uma amargura belíssima esse.

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