segunda-feira, 21 de junho de 2010

Macelas amarelas

Meu dia se faz diante de uma janela quase sempre empoeirada. Olho o mundo de fora sabendo que estou do lado de fora também e isso me remete no pensamento de quantas pessoas existem nas ruas, umas seguindo o mesmo caminho que eu, e as outras procurando suas próprias nuvens: “Quantas linhas se cruzando em bases de concreto”. Eu vejo o Cristo da mesma forma que vejo aquela pobre alma de rua vagando, enrolada a um cobertor, à procura de algo que sacie seu vício. Depois de algum tempo você se torna absolutamente cego pra esse tipo de coisa, talvez seja a normalidade não tão natural assim do nosso cotidiano. O dia estava feio de manhã cedo, tempo chuvoso, mas nada mais acentuado quanto o cinza dentro de mim; acho que quando os raios de sol tocam a pele essas coisas vão embora, evaporam-se em forma de suor. Definitivamente não queria mais olhar o Cristo.
Às vezes, penso nela e nas suas macelas amarelas, e isso faz o tempo passar mais rápido, faz-me esquecer do círculo de gotas de veneno que caem das minhas nuvens particulares, e acaba que não vejo as horas correrem. Pensamentos também tem pernas e os meus correm atrás dela, mas ela parece querer fugir... talvez sua mente tenha afundado, naufragado, tenha se tornado tão surda quanto uma pedra debaixo d'água. Eu grito seu nome e ela não me ouve mais. Seu pensamento se ligou a algo mais próximo, numa conexão mais perto do seu peito. E isso faz chover, o dia não é tão belo assim, sinto a cada dia um pedacinho de mim saindo de dentro dela; sou farelo e meus pedaços não podem ser encaixados, pois eles se desfazem com a água. Queria eu ver por onde seus pés passam, por quais estradas de terra se encontram suas pegadas, pois o meu desejo é deixar o meu desenho nessa terra molhada. 

3 comentários:

  1. as marcelas do campo perdem suas entidades quando o sol amanhece,

    elas são colhidas no despertar da noite,

    um beijón

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  2. Limpe a janela e desenhe, então. A gente quer sempre complicar as coisas.

    Já viu o filme Amèlie Poulain? O começo do seu texto me lembrou o começo dele onde Amèlie vai imaginando quantas coisas estão acontecendo no momento que está parada olhando a cidade... (se não tiver visto recomendo muito, um dos melhores filmes que já vi!)

    Sumiços à parte,
    abraço, Gui. :)

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  3. É bem assim! As coisas vão se tornando "Normais", ainda que não sejam. Éo cotidiano que nos cega.

    Adoro ler-te!

    Beijo, poeta!

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